quarta-feira, 30 de julho de 2008

Salário não basta

Marcia Pinheiro*

De maneira ainda sutil, há uma mudança na pauta de reivindicações das categorias organizadas do setor público e das estatais. As paralisações ocorridas neste ano reforçam o padrão de o trabalhador não se contentar apenas com a reposição da inflação, mas exigir uma maior cesta de benefícios.

A greve dos Correios foi emblemática. Encerrada na segunda-feira 21, os carteiros cruzaram os braços por 15 dias úteis. Arrancaram do governo o que queriam: um adicional de 30% sobre os salários, a título de insalubridade, para os 43 mil empregados que trabalham na coleta e distribuição externas. Outros 16 mil receberão um bônus de 260 reais. Conseguiram mais: nem sequer terão os dias parados descontados do contracheque. Será formada uma espécie de banco de horas a ser utilizado no futuro.

Há vários outros movimentos em curso, como o das agências reguladoras, o da Federação Nacional dos Estivadores e o da Federação Única dos Petroleiros (FUP). O que explica a ressurreição de exigências mais amplas é o aumento da oferta de empregos no País. “Queremos uma carreira. Até pela importância do nosso trabalho em áreas estratégicas”, diz Luiz Castilhos, do Comando Nacional de Greve das Agências Reguladoras. Existe espaço econômico para tais demandas, por enquanto. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, em junho houve um saldo líquido de criação de vagas de 309 mil, a maior da série histórica do governo. No primeiro trimestre deste ano, já foram abertos 1,361 milhão de postos, ante 1,095 milhão do mesmo período de 2007.

Trata-se do contágio positivo no setor público do crescimento do setor privado. Na terça-feira 22, assembléias de funcionários de agências reguladoras em todo o País votaram pela retomada da greve, iniciada em 30 de junho e interrompida em 11 de julho, para que as negociações com o Ministério do Planejamento retomassem seu curso. Curso que não resultou em acordo.

O governo propôs instituir uma agenda formal de negociação exclusiva para negociar as alterações nas quatro tabelas de salários destacadas pelos servidores, de forma a ser trabalhada num prazo máximo de 30 dias. A categoria rejeitou a oferta, por ela se sustentar em remuneração indireta. “Não queremos mais salários com subsídios, com penduricalhos. Queremos um montante só. Uma reestruturação geral, porque somos instituições do Estado”, diz Castilhos.

A explosão dos preços do petróleo e a importância estratégica da commodity para o País fizeram agigantar o movimento dos petroleiros. A palavra de ordem entre os funcionários é ruptura com os padrões passados de relacionamento com a Petrobras. A estatal ofereceu uma participação de lucros de 12% sobre os dividendos distribuídos aos acionistas, de forma linear, enquanto os funcionários exigem um porcentual mais próximo ao teto de 25% contemplado pela legislação. Segundo João Moraes, da Federação Única dos Petroleiros, há um impasse e os petroleiros prometem uma paralisação geral, a partir de 5 de agosto, se não houver uma melhora substancial nas ofertas da Petrobras.

Outro movimento que vai a todo vapor é o dos trabalhadores portuários. Wilson Barreto, presidente da Federação Nacional dos Estivadores, diz que são várias as pautas que emperram as negociações. Entre elas, destaca a manutenção dos portos públicos, o cumprimento da legislação quanto ao uso de mão-de-obra avulsa e a viabilização de um sistema de aposentadoria que contemple todos os trabalhadores do setor.

A festa, contudo, pode estar próxima do fim. A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central na quarta-feira 23 vai frear o desenvolvimento do País. Por unanimidade, o comitê elevou a taxa básica de juro em 0,75 ponto porcentual, para 13% ao ano. E não deu sinais de quanto vai perdurar o período de aperto monetário.

*Para a Carta Capítal - Fontehttp://www.cartacapital.com.br

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