quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Com apoio de 65,5% dos votos, Evo quer diálogo com oposição

Pablo Stefanoni

LA PAZ - No dia seguinte ao referendo revogatório, no qual Evo Morales foi massivamente ratificado, com cerca de 65,5%, e no qual os principais prefeitos (governadores) autonomistas também conseguiram uma massiva votação, ganhou força a necessidade de iniciar um caminho de reconciliação nacional. Uma chuva de chamados ao diálogo encheu os meios de comunicação, diante do temor de que os setores “duros” de ambos os blocos se aproveitem da votação obtida para impulsionar uma “fuga para frente” capaz de aprofundar a polarização política e regional evidenciada pela consulta.
“Peço aos prefeitos que deponham suas atitudes radicais e que trabalhemos juntos. É preciso deixar de lado as ofensas e agressões. O referendo nos obriga a colocar-nos de acordo”, disse o presidente boliviano em uma reunião com jornalistas estrangeiros. Ele anunciou que convocará os prefeitos para um encontro assim que forem publicados os resultados oficiais.
Esta posição – “flexível” para alguns e “de fachada” para outros – contrastou com o tom radical do governador cruceño, Rubén Costas, que, assim que foram divulgados os resultados, anunciou um aprofundamento do processo da autonomia e denunciou o “terrorismo de Estado” promovido por Morales a quem chamou de “macaco”.
Enquanto isso, grupos de apoiadores do governador cantavam que Evo não pisaria mais em Santa Cruz por ter sido “revogado” no departamento. O secretário de Autonomia cruceño, Carlos Dabdoub, mostrou-se incrédulo, segunda-feira, ao chamado presidencial ao diálogo e pediu, como sinal de flexibilização, que o Poder Executivo devolva os impostos petroleiros canalizados para pagar uma renda a idosos e para melhorar os orçamentos municipais.
Será realizada uma reunião do Conselho Nacional Democrático, que agrupa os líderes opositores atualmente em greve de fome, para definir uma posição pós- referendo. “Seríamos cegos se não reconhecêssemos a vitória do presidente. Pela primeira vez, o presidente não nos insultou nem ofendeu, o que pode nos dar alguma esperança. Oxalá, afaste os radicais e dê mais participação aos partidários do diálogo”, assinalou o senador do Podemos (direita), Tito Hoz de Vila.
Seja como for, a aproximação não será fácil. Enquanto que não região da “media luna” (de oposição) reclamam o reconhecimento de La Paz aos seus estatutos autonômicos, que incluem amplas prerrogativas para os governadores, como a titulação de terras, Morales repetiu que o governo aceita “autonomias para os povos mas não para umas poucas famílias”.
Essa mesma discrepância atingiu as tentativas anteriores de aproximar posições, transformando-as em um diálogo de surdos com acusações cruzadas que provocaram o fim das negociações logo no início. O avanço da contagem oficial mantém Evo Morales com mais de 64% dos votos favoráveis, enquanto que os quatro governadores da chamada “media luna” autonomista (Santa Cruz, Tarija, Beni e Pando) estão se mantendo comodamente em seus cargos.
Morales conquistou um apoio de aproximadamente 80% no oeste boliviano e teve votos negativos nas regiões do Sul e do Leste, ainda que o voto rural tenha aumentado suas chances de ganhar em Pando. Seguindo essa tendência, Evo será vitorioso em cinco departamentos (La Paz, Oruro, Potosí, Cochabamba e Pando) e derrotado em quatro (Santa Cruz, Tarija, Beni e Chuquiasca). No Palácio Quemado, o governo destacou a contundência da vitória: “Aumentamos nossa votação em Santa Cruz, onde chegamos a quase 40%; em Beni, passamos de 16% a 40%, e estamos perto de 50% em Pando”, avaliou o ministro sem pasta Héctor Arce.
A chegada dos resultados das áreas rurais mais afastadas favorece a Morales. Segundo estimativa do jornal La Razón, o presidente conquistou cerca de 84% de apoio no campo e 56% nas cidades. Cerca de 95% dos camponeses de La Paz votou pelo Sim e essa porcentagem foi de 92% entre os agricultores de Cochabamba.

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